sábado, março 25, 2006

Reminiscências


Dia chuvoso de março. Eu ia escorregando na almofada, enterrando minha cabeça entre a espuma e escondendo a face desfeita em lágrimas. Eu sempre quis que ele estivesse aqui. Eu sempre desejei falar com ele mais uma vez, como a daughter do filme do Michael Dudok. Apenas uma vez. Porque aqui chove e eu ainda espero como se ele estivesse voltando na próxima estação. Choro porque nem consegui me despedir dele... E todos os dias, como se ele estivesse sorrindo ao meu lado, repito que serei feliz. Só desanimo, incrivelmente, quando estou bêbada.






Para ele eu era o Linus, andava segurando uma fralda e pedindo colo. Eu sempre chorava e queria colo. Não queria que ele saísse de perto, porque eu já previa que a saudade me invadiria, após meus 7 giros em torno do sol.

a chuva escorre
boca adentro
e vou-me andando pela chuva
cata-vento

a chuva escorre pelos
olhos
e vou-me, atento
choro-chuva, meu alento

a chuva escorre
e vou-me
chorando chuva
a tempo
(poema dos 7 anos, quando descobri que perdas são irremediáveis)

sexta-feira, março 24, 2006

Simulacro















Quando se deseja alcançar de um dia para o outro o incomparável, o excepcional, digno da magia dos contos de fada, para onde se vai?
Thomas Mann, Morte em Veneza - presente de Reuben, estranho irmão com maior grau de miopia que eu)

***
hoje me senti a Lola. Eu só tinha 20 minutos para conseguir uma assinatura. corri e cansei, cansei muito. alías, estou muito cansada, quase um tédio. mas eu não tive outra oportunidade e nem morri no meio do caminho. bom?

***
enquanto corria algumas imagens vinham à cabeça. seria o que baudrillard fala?
ela é o reflexo de uma realidade profunda;
ela mascara e deforma uma realidade profunda
ela mascara a ausência de realidade profunda
ela não tem relação com qualquer realidade: ela é o seu próprio simulacro puro.
* não sei, mas continuo pensando que preciso da ajuda de alguém para lembrar momentos (maldita memória coletiva) e controlar minha ansiedade.

***
sonhei com duas torres. não sei se jogava xadrex ou se explodia torres. acho que a segunda opção é mais atraente. sim, eu explodia torres e saía correndo para escapar das fagulhas que iam sair voando.
além disso, corria para não ser encontrada. esquisito o sonho.
***
tenho uma câmera e vou registrar imagens. seja para correr com elas na bolsa, seja para registrar explosões de torres, seja para não esquecer...

terça-feira, março 21, 2006

Qualquer noite

vinha do terceiro andar. três passos eu andava e podia ouvir tudo com mais clareza. era os vermes que estavam ali atacando todos os meus livros. eu poderia gritar e mandar todos para o inferno ou (hell)p-me para o primeiro que aparecesse. era cinza o dia e eu nem sequer descansara. uma noite em que a cabeça pendia sobre o travesseiro procurando o jeito mais cômodo entre o incomodo de estar ali. acordava e dormia cansada. não estava triste, nem alegre, nem deprimida. angústia e mais nada. nada poderia fazer para cessar o vermes que atacavam e invadiam meus livros. eles estavam lá e eu sabia que quando estou com nada prefiro ficar quieta e deixar os vermes invadirem.
qualquer dia desses eu monto o grande manual que será o maior best-seller, mais uma besta que nada diz sobre como evitar pessoas. distraída e desinteressada, principais princípios. foda! odeio evitar pessoas. odeio fazer com que pareçam idiotas. mas a minha anti-socialidade está à flor da pele. e que se danem os pudores!decidi, numa dessas noites ouvindo os vermes, que só vou fazer o que me agrada. vou ver o pôr-do-sol todos os dias e traçar uma tabela de cores, todos os dias. eu sou legal e não mereço nada que não seja legal para mim. ponto (.)

sábado, março 18, 2006

a(versão) das palavras

difusamente
correndo das sílabas-saliva
que escapam pela
língua


(dias ouvindo andrew bird, pássaro ligeiro e azul. obrigada, reuben, bem que fizeste!)

terça-feira, março 14, 2006

Fragmentos da Madrugada

Notas de uma leitura tardia, Caio F. Abreu
"um gole disciplinado de vodca quando alguma corda do violino rebentava em plena sinfonia"
"prometera-se sentimentos mais intercalados"
"Voltar atrás no ir adiante"
"Dois olhos grandes de quem vê muito e não acha nada"
"Nunca a palavra exata, esclarecera de início"
"Porque a gente, alguma coisa dentro da gente, sempre sabe quando termina"
"Então dançaram, um de cada vez"
E ainda:
"André enlouqueceu ontem à tarde. Devo dizer que também acho um pouco arrogante de minha parte dizer isso assim - enlouqueceu -, como se estivesse perfeitamente seguro não só da minha própria sanidade mas também da minha capacidade de julgar a sanidade alheia. Como dizer então? Talvez: André começou a comportar-se de maneira estranha, por exemplo?"
DIAlógos (noite, bem tardios)
- Acho que tenho as mesmas dúvidas da Lola.
- Quem é Lola?
- Corra, Lola, corra. Droga!
- Eu ainda que acho que tu vais chegar à Lua
- Onde?
- Lua, aquele astro sem luz própria
- Não sei. Queria mesmo conhecer Natal.
Parte B, disco velho arranhado
- Não acho que você seja insegura
- Tô escutando Billie...
- Ainda acho que você vai insanar e correr com a mochila nas costas
- Toca Lover Man
- Carajo, dá para escutar o que eu estou falando!?
Bonus Track
- Quem foi Isabel Allende? Era prima do Salvador?
- Era.
- Já gostei dela.

domingo, março 12, 2006

In the sky with diamonds...

O dia se encerra em 3 três desejos:

A menina vai arrastar a sandália e correr pela avenida, liricamente com uma flor, tulipa nordestina em mãos;

A menina vai narrar a epopéia das noites de verão nos trópicos, sabe-se lá com qual vinho, com qual música (certamente a mais recente descoberta que o grito anunciou);

A menina vai querer que o menino imite a coreografia das estrelas, cadente passos, uma dança espacial, astronauta disfarçado, apenas mais uma conquista...

E a menina chora para o sol despontar no primeiro piscar de olhos atentos para o dia nascer, olhos que não descansam para ver o sol aparecer.

sábado, março 04, 2006

sexta-feira, março 03, 2006

Sexta, uma segunda demorada e chuvosa

Dormi até esquecer que acordar seria o próximo passo ou lembrar o que Lispector sussurrou: há vida – mesmo tendo que vivê-la ou não. Sorrateiramente, não-inteira, acordo com o barulho da TV, vindo da sala, despertador narrativo que anunciava o suicídio do então moribundo. Como se não quisesse, ainda tentei lembrar da noite passada, ligeira na memória a história quase dilacerada e dolorida.

Continuo escutando Billie e me pergunto o motivo de gostar tanto dela. Sinceramente, não sei se gosto dela por involuntariamente gostar, ou se é porque acho bonito gostar da Billie. Pensei nisso um bom tempo e me dei conta que perdi várias horas em mim e na minha cabeça, que anda povoada com seres encantados e muitas fotografias. Gostaria mesmo de ir ao Batista, pedir a dose de canela (- apenas um dedinho, não mais que isso, por favor) e perguntar por qual razão ele não gosta de fotos. Talvez não tenha razão alguma. Eu mesma não gosto de fotos minhas... sempre acho que a câmera vai propositalmente captar meu olho torto.

Caminhei ainda comigo, sempre. Encontrei amigo antigo e pensei que sou cruel por não procurar as pessoas que gosto e que sempre demonstram afeto e uma inclinação em tentar me compreender. Andava com o transeunte, falávamos bobagens e subitamente veio uma vontade visceral de dizer que estou com medo, quero colo e que se dane a fantasia da mulher fortaleza. Chorar é um remédio e não apenas um conforto. Gostaria de chorar com os pés descalços e tirar a blusa para respirar melhor... e que se danem – também - os pudores!

Um presente e um adeus! Mais um! Sinto mais falta dos dedos ao violão que a companhia. Tenho gostado de estar só e visitar imaginariamente os amigos que recordo. Vou fazer um curso com cerâmica e andar mais com as sandálias desconfortáveis. Vou ler mais contos e saber mais sobre a minha vida off line.

Colasanti escreve sobre a mulher que tinha a lua sob a pele. Ando achando que tenho o mar sob os olhos... Lágrimas e mais um copo de vinho com sabor da cachaça do Batista, - apenas uma dose, por favor.

Une(versos)
E a(terra) palavras...