quarta-feira, setembro 13, 2006

one more, please

Parece una broma, pero somos inmortales (...)
Cortázar


parece tarde, mas que seque o mar
ainda que me peças eu alcanço todos faros
e ardo
enquanto o tempo
arremesse o barco para o alto
e amargo
todas as tuas desventuras

e somos imortais, até que sol
arqueje preciso
entre o desconcertante
passeio inciso de um rio
sob o pacífico

homenagem do andy warhol...

Zine Virtual...

as paredes estão todas sujas por dentro. [voz alta e timbre retrô agudo, canção vinil arranhada pelo tabaco que nunca vai abandonar a boca]. fine, fine. aquela fumaça nem cessa mais, mas poderia parar de sujar as encardidas e talvez brancas paredes de tinta óleo; olho sempre ao redor e me sinto a solidão do aquário da gaiola do apartamento vazio

porque eu e minha fumaça estamos terrivelmente sós nessas paredes sujas e limpas de solidão que nem temos tempo de pensar se ainda faz frio lá fora

através da porta




just it. queria ter feito uma programação visual, queria ter feito texto em papel com imagens. não consegui e vou postar agora as linhas prometidas ao papel. porque nem sempre os planos saem como folhas brancas da cabeça.

domingo, agosto 20, 2006

Todas as vidas dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera das obscuras.
Cora coralina



e não há quem diga:

que essa vida afora desejo
é o leito agonizante que a fêmea esconde

ao ser indagada

e responde arteira pelo solfejo
dor mi só

***

http://aduna.free.fr/aduna.blog/blog.htm

tem esse blog só com música africana. ainda não posso indicar nada, porém adianto que a áfrica é minha nova fissura.

quarta-feira, agosto 16, 2006

Sarabanda, Bergman

Desde que Otar Partiu, Julie Bertucelli

a cabeça sempre funciona muito mais do que deveria. ouvi essa frase e pensei na instantaneidade das imagens que surgiam enquanto escutava a frase. sempre páro e penso além da cota cedida pelos normais do circo flutuante. pensar já é um ato não-estéril e abre as possibilidades para outros pensamentos, como uma caixa que não possui fundo ou um grande edifício para o olhar de uma criança de 3 anos. - mas é tão alto!

nesses rápidos minutos eu penso que alguns aromas ou imagens me deixam tristes. ou poderiam não deixar, caso eu não estivesse pensando neles. pensar nos deixa sensivelmente ligados nos sentidos que o pensamento provoca.

antes, porém, eu achava que rosas tinham um perfume que me despertava a dor. ainda penso que rosas despertam dor pelo aroma que exalam, pois associo a imagem no pensamento com o cheiro que não preciso sentir para ficar triste.

não era sobre isso.

solidão e falta de perspectivas são temas que sempre penso, apesar de não ficar triste ao pensar. dois filmes não me saem da cabeça. Sarabanda, do bergman. apenas 4 personagens.

nada mais além da solidão e das mágoas que vão entupindo as artérias. um cheiro de rosas invade a relação de todos os 4. eles vivem para uma rosa que já morreu.

depois vem Desde que Otar Partiu, da julie bertucelli. Três gerações de mulheres que não acompanham o seu tempo. A mais velha crê e vive no presente. A mais nova não enxerga futuro. A outra não vive.

eu penso em filmes que me deixam tristes ao pensar neles.

terça-feira, agosto 15, 2006

desses dias em Saturno

esclarecerei.

sentado na cadeira onde vi sarabanda de bergman eu me debrucei sobre os textos que há muito devia ter lido. esses dias têm me consumido com ócio e mais algumas agruras cotidianas que se esgotam quando eu pego o ônibus em menos de trinta segundos de espera.

espero contribuir para a satisfação humana através do meu sorriso ao calçar as legítimas havaianas ou só sair de casa com uma reles blusa, sem tanto tecido.

nesses dias em saturno, eu descobri que ler em voz alta pode fazer bem para a memória. acho que é um bom exercício para as cordas da voz. além disso, gritar incita o desejo de sair correndo, pelos anéis ou pelas ruas, cortando os automóveis em tráfego ou ouvir as vicissitudes da vizinhança às 7h30.

escrever é uma das maiores esquizofrenias.
descobri e esclareci tudo. ainda estava em Saturno.

terça-feira, maio 16, 2006

Poema ao homem do meu tempo

tão rápido
quanto o nascer do sol
ele guarda
os tons -
vermelho-púrpura-carmim
os sons das cores que brotam -
efêmeros sob a pálpebra
***
tudo resulta de um súbito e instantâneo
meditar sobre a cordas
um suave e ligeiro desconcerto
de mãos que calam enquanto
ele estrangeiro do meu corpo, lasciva
fêmea ante os desejos do cio
***
esse clarão calado que dura
minutos em mim
possui a beleza dos dias claros,
a sofreguidão das noites (cujas gotas da chuva escapam da caça dos telhados)
a delicadeza de um vibrato ostensivo e interno
e entranhas:
***
como se fosses nascer tu em mim
tu nascendo do ventre colorido
e descobres, amor,
a matéria viva
essa carne em sentidos, o girassol
se pondo.
***
(recolho-me para enxergar a melodia do sono, tão harmonioso quanto a ação anterior. ele, exausto do movimento de nascer o prazer escondido, ri - quase imperceptivelmente)

sábado, maio 13, 2006

dias assim

sempre acreditei em vida após a morte, papai noel com saco vermelho cheio de prendas, coelhinho da páscoa com cenoura em punho, no diabo do fime do glauber rocha, em astronautas que visitam a lua (Viva os EUA!), em poemas psicografados, em ovo light, no Bush, no Osama, no PT (conseqüentemente no Fome Zero), em palavras que vêm por e-mail, em amores impossíveis, nessas propagandas que vendem produto para emagrecer, na Rede Globo (especialmente na Mirante), nos meninos que carregam fotos de pessoas doentes nos ônibus, no meu pai como herói de revista em quadrinhos, em beijo de novela, na disponibilidade dos políticos, em compras muitos fáceis e sem juros, em fotos que são bonitas (mas todos garantem não depender do Photoshop), nos risos no canto da boca, nas mãos nervosas que tentam convencer, nas pessoas prestativas que nada exigem em troca, nas ruas cheias de transeuntes que passam sem nada querer, na chuva que não é a culpada pela gripe, na praia não poluída, na gasolina não adulterada, na morte da bezerra, no "vai ver se eu tô lá na esquina"...
não acredito em mais nada, diz ele, pesando a cabeça e curvando-a - com uma vermelhidão na face -, envergonhado de não ter mais referência, nenhum motivo para continuar andando não tenho mais nada, grita. bebe mais um copo de cerveja, assiste o jornal e vê a heloísa helena; talvez ainda tenha opções, não deseja acabar no niilismo dos poetas que não escrevem mais. a vida é dura e eu nem comprei minha camiseta, muito nacional, para a copa...
***
esses dias descobri que tatus escrevem. posso provar: www.chacarerablues.blogspot.com
e eu fiquei muito orgulhosa disso...

sexta-feira, maio 12, 2006

Reconhecimento

Gustav Klimt: Hygiei
há palavras que não me conhecem
alguns desses barulhos
que semeiam, também não me conhecem

nem a doçura
nem timidez dos olhos curvados

todas essas formas, desde as circulares
essas mesmas formas não me apetecem
nem a fumaça do teu hollywood, cujo espirro expulsa teus indícios em mim
nem o vestido rude que uso
nada não me percebe

apenas a vontade de reter a lágrima
a lágrima cilíndrica e turva
talvez essa lágrima
apenas ela

de todas as coisas que existem
conheça minha palavra, a única não dita.

http://www.expo-klimt.com

site do Klimt... bom ver todos os sonhos dele por lá.






quarta-feira, maio 10, 2006

a dança dos dedos

excerto do diário, póstumo
alguns segredos, caro ouvinte, não se guardam em caixinhas de sapato. sim, aqueles mesmos pares que usei no fatídico dia em que subtraía a tua onipresença tomando o licor que detestava. participei da mesmice festiva com um vã entusiasmo só para reter teus olhos que nem estavam lá. caminhei na ponta dos dedos, sobressaltada com os ruídos que minha barriga fazia no imenso saloon, no instante que pensava que chegar ao consenso nunca será possível, porque meus instintos sombrios me obrigam a desejar que cesse a dor da tua presença petrificante que congelo em minhas pequeníssimas mãos que decorei com as cores hortelã dos dias claros.
esses segredos, amado, mostram-se como a fulgaz sombra distante da vela, aumentando o tamanho e tornando-a translúcida. essas magias secretas que guardam as mulheres são as páginas amareladas e ruídas que não podem constituir-se jamais. penso, sobretudo, que caminhar na ponta dos dedos exercita a fragilidade dos contos obscenos que guardamos. eis que os desejos impublicáveis nunca serão transformados em um roteiro discutido numa mesa de bar. minha indiferença, tu conheces. não ouso pronunciar a tímida referência dos meus sonhos não-cristãos.
querido, só um apelo: mulheres carregam dores e sombras. sóis nos dias nublados, como essa tarde em que colho flores e passeio com teu coração em mãos, geladas pelo frio que guardo. não queiras desvendar as necessidades que não se esgotam numa noite, cujos gemidos serão ouvidos pelos mestres tântricos do nosso livro na estante. são as maresias de instabilidade que correm nos olhos, essa tentação de voar - são os pensamentos que nunca serão escritos, pequeno, são as doses de insanidade que toda mulher esconde sob as unhas rubras.
descubra o tempo da colheita. descubra e vá. deixe-me quando souber que a satisfação consiste no segredo, o segredo que a boca não falará, essa boca que beija e esconde.

sábado, maio 06, 2006

Blue

escuto joni mitchell, como se estivesse escutando sempre
ainda acho que ele é mais encantador com a boca
fechada e com o sol entre os lábios que insistem em acompanhar os olhos que balbuciam a antiga canção
dos ventos alheios ao que ele
fala
(gosto de vê-lo gritar com a boca cerrada)

sexta-feira, maio 05, 2006

Sôfrego poeta

foge enquanto há tempo

por essa rua vai tropeçando sobre as latas
e foge da angústia desvairada

que comerá tua
córnea e o que houver da
alma comestível

e restará a dúvida a
sete palmos
a dúvida sempre consumida em dentes cerrados

minhas palmas para quem nunca falou
o que não devia


(minha fase, digamos, augusto dos anjos... que nada, foi um sonho, um roteiro ou algo de comer, quase uma receita)

quarta-feira, abril 26, 2006

just do it...

eu invejo a tristeza comedida
a beleza quase deprimente do terror, a mentira
que me salta e ferve a carne molhada das lágrimas
que escorre pelos becos da nostalgia que desprezo.

eu invejo os olhos tristes que escapam
pelos cílios que piscam pelos retrovisores nesse sábado
onde todos ainda choram
o ponteiro atrasado do relógio antigo

porque eu, que sempre descarto o jogo das ruas em multidão,
que rasgo sorrisos aos passantes
(escondo a melancolia dos dias cinzas)


e invejo
irremediavelmente
a tristeza das árvores sem vento
a medida exata
da tristeza sem saída, porta de emergência





(escutando os poemas de hilda... sou invadida por uma dessas feras que só acordam nas madrugadas e saem por aí. hilda é bicho selvagem, suas palavras nunca serão domadas... e eu queria um pouquinho dessa coragem para continuar escrevendo. o responsável por esse momento: zema ribeiro)

quinta-feira, abril 20, 2006


ouvindo nocturne, do haden

são apenas alguns dias em que tudo que estiver por perto
não estará tão mais perto que teu sorriso adormecido ao meu lado
e eu ousarei agarrá-lo para que se congele esse riso-sem-querer,
porque eis que no inverno todas as flores se desabrocharão com o raio de luz que escapa dos teus olhos,
o mar-lilás que busco todos os instantes em que não estás tão perto como a chuva que me molha
os olhos que te procuram pelo mar-lilás
tateando a boca ainda não tocada pelo adormecido / anunciando o amante que haverá o
dia de descobrir o que há pelo teu corpo que ainda não foi
decifrado
escutando por dentro a melodia que afaga as borboletas que estarão em volta
aos rodopios que darei quando estiver bem perto...


(e estaremos mergulhados na doçura de todos os pensamentos que traçamos antes de estar mais perto)

***
ao tatu que tanto me ensina... tenho pensando no quanto já aprendi com ele, quase sem querer. a maior de todas as lições é que tudo é possível... e eu o amo da maneira mais impossível que poderia imaginar. o poema é para ele e dele. e eu acho que tu não comentares no blog, para não marcar território, é bobagem...

quarta-feira, abril 19, 2006

Gilda


eu desisti de fazê-lo entender que eu não queria fazê-lo compreender o que se passava. enquanto eu ia andando bailarinamente pela rua, ouvia os cães latirem anunciando minha passagem. foi difícil o diálogo e difícil era a lua que espiava a minha noite, um incômodo e a síndrome da árvore parada que não era mais verde e nem era outono. a multidão do dia se dissipava em cada rasa sombra e eu sentia o vazio dos corpos em chama, dos corpos cansados, dos corpos bêbados. debatia-me com as pessoas imaginárias, flâneur que não observa, mercadoria dos tempos modernos que confere o desaparecimento de um classicismo que será lembrado assustadoramente pelos que virão. eu lembrava nosso diálogo, enquanto ria do rua vazia - ajeitando o cabelo com o charme antigo de rita hayworth, pensando nele me olhando. ele sabia, ele sabia que eu não queria que comentassem o meu desejo de ser a rita hayworth.
ri sozinha. senti a leveza de um quarto vazio, um aquário cheio e as lembranças de uma discussão fingida (sempre fingimos quando discutimos), só para enganar o tédio, só para a noite passar mais rápido, ligeira escuridão. ainda andando bailarinamente, escondi a foto dela, tropecei metirosamente na calçada e adormeci como os nauseabúndicos; uma vontade de ver a gilda na sargeta...
***
tentei colocar uns links, mas minha incapacidade digital está dominando tudo. então, vai na postagem mesmo:
O primeiro link é de uma poeta argentina, a Alejandra Pizarnik, meu grande achado e talvez uma das leituras mais viscerais desses meus tempos. Descobri numa dessas jogadas de sorte no pôquer, onde havia apostado tudo. Não preciso dizer que encontro uma identificação dilacerante nas linhas dela...
O segundo link é do meu querido Cortázar. É engraçado e pode ser louco ouvir algumas narrações do próprio. Aliás, escrevi um poema ao Júlio (claro, é Júlio mesmo, o fato de dormir ao lado dele já me dá intimidade suficiente para isso) e à Carol Dunlop. Depois, depois de pensar muito, acho que será a próxima postagem.
Quanto ao desabafo anterior, só um comentário: gosto dos anônimos.

terça-feira, abril 18, 2006

Sincronia

18 de abril de 1965, Buenos Aires
No escribo más este diario de una manera continuada. Tengo miedo. Todo en mí se desmorona. No quiero luchar, no tengo contra quién luchar. Todo esto es tan viejo, tan cansado. Ojalá pudiera no mentir nunca.
(Alejandra Pizarnik)
18 de abril de 2006, São Luís
Às vezes acho que sou displicente com este blog. Tenho medo desses meios digitais, tenho medo de quem está lendo tudo isso. Não tenho contra quem lutar, meus inimigos são todos virtuais... Tudo isso é tão novo e essa angústia me dá sono. Quisera eu não sofrer nunca.
(Eu mesma)

quinta-feira, abril 06, 2006

Som over

Depois de um sôfrego dia, a bailarina esconde as sapatilhas e o espartilho na gaveta, como quem esconde um revólver ou um material erótico. Uma fuga sem razão, ilícita e desprovida de desejo. Ela fecha meticulosamente o compartimento, coloca Miles Davis na vitrola, dança em frente ao espelho que reflete um tímido olhar e pensa que a loucura é companheira da angústia. São 10 anos de solidão e a bailarina dança lançando olhares para ela mesma onde se encontra a multidão de uma platéia silenciosa. Olha o relógio e pega o primeiro livro de poemas, uma escritora qualquer que nem sabia pronunciar o nome. Lê a página 256 e ri desgraçadamente por não saber o motivo do riso.

dose medida pela
idas da noite
vigia de mim mesma
sobre a testa estampada o
desespero de uma tela
era munch
e seu segredo
manchado sobre o vestido
nos idos de um tempo
sem nuvens
céu claro
que não sabia
a maresia
e escondia debaixo do colchão
som overdose
de angústia


Fecha o livro e imagina a fantasia do próximo espetáculo para ninguém...

terça-feira, abril 04, 2006

Ao passante

"Pessoas pertencidas de abandono me comovem: tanto quanto as soberbas coisas ínfimas" (Manoel de Barros)
levantei sob o susto da presença fantasmagórica do chinelo dele rondando a casa. eu que mantive todo o chão limpo, sagrado ofício, para as pisadas cortantes e terrivelmente macias dos pés incautos . há o que fazer! ouvi gritos. os pesadelos constantes em uma tarde chuvosa, enquanto ouço passos seguidos de uma respiração cansada e entediante - um ritmo e um verso em branco que não foi lido nos saraus das noites sem vinho. permaneci atenta ao silêncio que emudecia, que soprava medos e suscitava alucinações. continuava com as pegadas dadas pela sala, enquanto eu solfejava uma canção sem o ritmo do silêncio. eram 3h da manhã, nem havia limpado os cômodos, mas os pés teimavam em sapatear na minha memória, conferindo ao passante a materialidade que os assombros parecem ter. distração com uma foto em preto e branco vestido era o que eu usava enquanto sorria timidamente ao meu observador. mais uma vez, tomava a penúltima xícara de café da noite e olhava pela janela os passos dos que já foram e continuam seguindo. parei de solfejar, coloquei calculadamente a xícara sobre a TV que chiava, calcei os sapatos que ganhei do homem que pisava o chão limpo com meu tédio e saí procurando, pela noite, as pisadas que escutara durante toda a vida. porque o meu, esses dons que crescem em árvores, era esperar contar os passos até o sono apossar-se do corpo e o sonho compreender a despalavra.

segunda-feira, abril 03, 2006

O ano passado

incidentalmente, ouvi pierrô apaixonado, noel nos dias de confete

ferida
meu calo que não silencia
esse pesado pé putrefado
que desanda


(pelo carnaval passado, onde desfilava meus pés nus sobre o caco da avenida tingida de sangue)

sábado, março 25, 2006

Reminiscências


Dia chuvoso de março. Eu ia escorregando na almofada, enterrando minha cabeça entre a espuma e escondendo a face desfeita em lágrimas. Eu sempre quis que ele estivesse aqui. Eu sempre desejei falar com ele mais uma vez, como a daughter do filme do Michael Dudok. Apenas uma vez. Porque aqui chove e eu ainda espero como se ele estivesse voltando na próxima estação. Choro porque nem consegui me despedir dele... E todos os dias, como se ele estivesse sorrindo ao meu lado, repito que serei feliz. Só desanimo, incrivelmente, quando estou bêbada.






Para ele eu era o Linus, andava segurando uma fralda e pedindo colo. Eu sempre chorava e queria colo. Não queria que ele saísse de perto, porque eu já previa que a saudade me invadiria, após meus 7 giros em torno do sol.

a chuva escorre
boca adentro
e vou-me andando pela chuva
cata-vento

a chuva escorre pelos
olhos
e vou-me, atento
choro-chuva, meu alento

a chuva escorre
e vou-me
chorando chuva
a tempo
(poema dos 7 anos, quando descobri que perdas são irremediáveis)

sexta-feira, março 24, 2006

Simulacro















Quando se deseja alcançar de um dia para o outro o incomparável, o excepcional, digno da magia dos contos de fada, para onde se vai?
Thomas Mann, Morte em Veneza - presente de Reuben, estranho irmão com maior grau de miopia que eu)

***
hoje me senti a Lola. Eu só tinha 20 minutos para conseguir uma assinatura. corri e cansei, cansei muito. alías, estou muito cansada, quase um tédio. mas eu não tive outra oportunidade e nem morri no meio do caminho. bom?

***
enquanto corria algumas imagens vinham à cabeça. seria o que baudrillard fala?
ela é o reflexo de uma realidade profunda;
ela mascara e deforma uma realidade profunda
ela mascara a ausência de realidade profunda
ela não tem relação com qualquer realidade: ela é o seu próprio simulacro puro.
* não sei, mas continuo pensando que preciso da ajuda de alguém para lembrar momentos (maldita memória coletiva) e controlar minha ansiedade.

***
sonhei com duas torres. não sei se jogava xadrex ou se explodia torres. acho que a segunda opção é mais atraente. sim, eu explodia torres e saía correndo para escapar das fagulhas que iam sair voando.
além disso, corria para não ser encontrada. esquisito o sonho.
***
tenho uma câmera e vou registrar imagens. seja para correr com elas na bolsa, seja para registrar explosões de torres, seja para não esquecer...

terça-feira, março 21, 2006

Qualquer noite

vinha do terceiro andar. três passos eu andava e podia ouvir tudo com mais clareza. era os vermes que estavam ali atacando todos os meus livros. eu poderia gritar e mandar todos para o inferno ou (hell)p-me para o primeiro que aparecesse. era cinza o dia e eu nem sequer descansara. uma noite em que a cabeça pendia sobre o travesseiro procurando o jeito mais cômodo entre o incomodo de estar ali. acordava e dormia cansada. não estava triste, nem alegre, nem deprimida. angústia e mais nada. nada poderia fazer para cessar o vermes que atacavam e invadiam meus livros. eles estavam lá e eu sabia que quando estou com nada prefiro ficar quieta e deixar os vermes invadirem.
qualquer dia desses eu monto o grande manual que será o maior best-seller, mais uma besta que nada diz sobre como evitar pessoas. distraída e desinteressada, principais princípios. foda! odeio evitar pessoas. odeio fazer com que pareçam idiotas. mas a minha anti-socialidade está à flor da pele. e que se danem os pudores!decidi, numa dessas noites ouvindo os vermes, que só vou fazer o que me agrada. vou ver o pôr-do-sol todos os dias e traçar uma tabela de cores, todos os dias. eu sou legal e não mereço nada que não seja legal para mim. ponto (.)

sábado, março 18, 2006

a(versão) das palavras

difusamente
correndo das sílabas-saliva
que escapam pela
língua


(dias ouvindo andrew bird, pássaro ligeiro e azul. obrigada, reuben, bem que fizeste!)

terça-feira, março 14, 2006

Fragmentos da Madrugada

Notas de uma leitura tardia, Caio F. Abreu
"um gole disciplinado de vodca quando alguma corda do violino rebentava em plena sinfonia"
"prometera-se sentimentos mais intercalados"
"Voltar atrás no ir adiante"
"Dois olhos grandes de quem vê muito e não acha nada"
"Nunca a palavra exata, esclarecera de início"
"Porque a gente, alguma coisa dentro da gente, sempre sabe quando termina"
"Então dançaram, um de cada vez"
E ainda:
"André enlouqueceu ontem à tarde. Devo dizer que também acho um pouco arrogante de minha parte dizer isso assim - enlouqueceu -, como se estivesse perfeitamente seguro não só da minha própria sanidade mas também da minha capacidade de julgar a sanidade alheia. Como dizer então? Talvez: André começou a comportar-se de maneira estranha, por exemplo?"
DIAlógos (noite, bem tardios)
- Acho que tenho as mesmas dúvidas da Lola.
- Quem é Lola?
- Corra, Lola, corra. Droga!
- Eu ainda que acho que tu vais chegar à Lua
- Onde?
- Lua, aquele astro sem luz própria
- Não sei. Queria mesmo conhecer Natal.
Parte B, disco velho arranhado
- Não acho que você seja insegura
- Tô escutando Billie...
- Ainda acho que você vai insanar e correr com a mochila nas costas
- Toca Lover Man
- Carajo, dá para escutar o que eu estou falando!?
Bonus Track
- Quem foi Isabel Allende? Era prima do Salvador?
- Era.
- Já gostei dela.

domingo, março 12, 2006

In the sky with diamonds...

O dia se encerra em 3 três desejos:

A menina vai arrastar a sandália e correr pela avenida, liricamente com uma flor, tulipa nordestina em mãos;

A menina vai narrar a epopéia das noites de verão nos trópicos, sabe-se lá com qual vinho, com qual música (certamente a mais recente descoberta que o grito anunciou);

A menina vai querer que o menino imite a coreografia das estrelas, cadente passos, uma dança espacial, astronauta disfarçado, apenas mais uma conquista...

E a menina chora para o sol despontar no primeiro piscar de olhos atentos para o dia nascer, olhos que não descansam para ver o sol aparecer.

sábado, março 04, 2006

sexta-feira, março 03, 2006

Sexta, uma segunda demorada e chuvosa

Dormi até esquecer que acordar seria o próximo passo ou lembrar o que Lispector sussurrou: há vida – mesmo tendo que vivê-la ou não. Sorrateiramente, não-inteira, acordo com o barulho da TV, vindo da sala, despertador narrativo que anunciava o suicídio do então moribundo. Como se não quisesse, ainda tentei lembrar da noite passada, ligeira na memória a história quase dilacerada e dolorida.

Continuo escutando Billie e me pergunto o motivo de gostar tanto dela. Sinceramente, não sei se gosto dela por involuntariamente gostar, ou se é porque acho bonito gostar da Billie. Pensei nisso um bom tempo e me dei conta que perdi várias horas em mim e na minha cabeça, que anda povoada com seres encantados e muitas fotografias. Gostaria mesmo de ir ao Batista, pedir a dose de canela (- apenas um dedinho, não mais que isso, por favor) e perguntar por qual razão ele não gosta de fotos. Talvez não tenha razão alguma. Eu mesma não gosto de fotos minhas... sempre acho que a câmera vai propositalmente captar meu olho torto.

Caminhei ainda comigo, sempre. Encontrei amigo antigo e pensei que sou cruel por não procurar as pessoas que gosto e que sempre demonstram afeto e uma inclinação em tentar me compreender. Andava com o transeunte, falávamos bobagens e subitamente veio uma vontade visceral de dizer que estou com medo, quero colo e que se dane a fantasia da mulher fortaleza. Chorar é um remédio e não apenas um conforto. Gostaria de chorar com os pés descalços e tirar a blusa para respirar melhor... e que se danem – também - os pudores!

Um presente e um adeus! Mais um! Sinto mais falta dos dedos ao violão que a companhia. Tenho gostado de estar só e visitar imaginariamente os amigos que recordo. Vou fazer um curso com cerâmica e andar mais com as sandálias desconfortáveis. Vou ler mais contos e saber mais sobre a minha vida off line.

Colasanti escreve sobre a mulher que tinha a lua sob a pele. Ando achando que tenho o mar sob os olhos... Lágrimas e mais um copo de vinho com sabor da cachaça do Batista, - apenas uma dose, por favor.

Une(versos)
E a(terra) palavras...

sábado, janeiro 14, 2006

Recortes poéticos do não vivido...

Ao passante, cuja efemeridade se traduz no irreal
Car j’ignore où tu fuis, tu ne sais où je vais,
O toi que j’eusse aimée, ô toi qui le savais!
(Baudelaire)

Duas da tarde:
Exceto o sol
Sobre a tez
ouro
é cedo enquanto
o desejo evapora
hora, sem querer dizer
a deus
a(o)
meu mundo
fora de órbita

Ouvindo Jamie Cullum...
devia pedir que apagasse o cigarro
calasse minutos, outorgando pensamentos
porque eu nem saberia
dizer o quanto ainda a
existência resiste ao passar andarilho do relógio
(o óbvio era meu olhar confirmando o que tu dizias)


(pensando no sério almodóvar)

Há sempre o instante
Instável
Instantâneo
- prolongado,
Conta gota, cata-vento
retendo
o que não volta e lento
Se esvai...

(para quem acha que a morte é uma nascimento...)

O volume era tão alto que nem sabia quem eu olhava

A imagem da televisão gritando ainda era mais nítida que o transeunte,

Que nada dizia

Ia, apenas
Cambaleando pela rua da praia grande
(ele parecia ainda mais sério com os cabelos presos, pretos)
Mesmo assim ainda
tinha o semblante
ante a náusea de ver-me
desprezível moribundo

segunda-feira, janeiro 09, 2006

for:migas

as formigas. todas elas caminham irremediavelmente, sem que meus dedos, apoiados sobre o chão frio da cerâmica, consigam acompanhar os insetos que pertencem à ordem dos Hymenoptera, eu já sabia porque já fui arrebatada, certo período, por formigas, vespas, abelhas, libélulas... mesmo que eu quisesse acompanhar as minúsculas pernas das formigas com o meu dedo indicador a minha intenção fracassaria. ainda acho, ao ver esses artrópodes, que eles são o melhor exemplo para se pensar sobre a vida que urge, surgindo possibilidades. tenho respeito pelas formigas, principalmente as operárias, porque conseguem viver 6 anos, caso não ocorra nenhuma intempérie, como o meu dedo indicador esmagar em um belo dia de sol ou ainda meu all star cego tatear - sem intenção - esse inseto, nada medíocre, e esmagá-lo impiedosamente. chovendo, penso nas formigas que serão atingidas por uma enorme gota de chuva, afogadas pela ínfima enxurrada, pelo olhar das formigas, morte inexplicável, fenômeno natural. há ainda casos onde formigas morrem por um dos pecados capitais: a gula. já vi esses desprezíveis, mas não menos interessantes, digamos bichinhos, cometerem suicídio ao carregarem toneladas de doces nas costas... não sei, vou repensar a cadeia alimentar e traçar esses novos caminhos que um pequeno ser pode trilhar. agora, há dezenas rodando perto de mim e meu dedo indicador digita em velocidade inversamente proporcional às pernas agitadas e velozes das amigas formigas.

terça-feira, janeiro 03, 2006

passado presente...


curvada sobre a onda
estrela e clara ronda manhã
amanhã, sol do meio dia
forte maresia, tua parte
tempestade

brilhando, passos de mim
borboleta do mar,
sei que ainda estás aqui
voando pela lágrima oceano
mais anos, luz

vaga lume
melhor é ver asas deslizando na maré
baixando o céu
no horizonte, sereia colorida
outras idas, outros mares
de quem não enxerga ares
que a água
é a terra do alto,

eu canto
por mais que exista
cores réplicas no ar
borboleta-bailarina, bate asas no mar
que o mar é tua casa
dia de nadar, voar rasante pela onda
vazante


recebi cobranças de amigos da época da escola. eu teria que colocar no blog o que eu fazia por aqueles tempos (o que nem faz tanto tempo assim...). lembrei de mais uma história do herzog (feita lá pelos idos 2000). nounouse é um personagem (diria que é sonique) e foi tirado de um poema de vinícius de moraes. lembrei desse desenho porque recebi esse poema, ontem, presente da carol! os versos ao lado se configuram uma canção, sem título, também de 2000 (ou seria 2001?). há tempos não escrevo canções...

escuto edu lobo e tom, que roda pela 2º vez. lembro de tudo. sinto saudade furacão, calo. há 2 dias não faço outra coisa que não seja pensar. postar no blog, agora, é apenas uma exceção na rotina. aqui e em mim chove.